Quando 'Liberar a Guia' Não Basta: Justiça do Paraná Determina que a Unimed Custeie Tratamento em Clínica Indicada pela Família no TEA
Em caso recente no Paraná, a Justiça determinou que a UNIMED custeie o tratamento de uma criança com Transtorno do Espectro Autista (TEA) na clínica indicada pela família, respeitando o método terapêutico prescrito e o vínculo já estabelecido com a equipe. A decisão reconhece algo essencial: em TEA, continuidade e adaptação não são detalhes administrativos — são parte do próprio tratamento.
Ana Oliveira
9/5/20253 min read


Decisão no PR garante custeio pela UNIMED em clínica indicada para criança com TEA. Entenda vínculo terapêutico, ANS RN 539/2022 e reembolso fora da rede.
Em caso recente no Paraná, a Justiça determinou que a UNIMED custeie o tratamento de uma criança com Transtorno do Espectro Autista (TEA) na clínica indicada pela família, respeitando o método terapêutico prescrito e o vínculo já estabelecido com a equipe. A decisão reconhece algo essencial: em TEA, continuidade e adaptação não são detalhes administrativos — são parte do próprio tratamento.
O que a regulação já garante
Desde 01/07/2022, a ANS tornou obrigatória a cobertura para qualquer método ou técnica indicado pelo médico assistente no tratamento dos transtornos enquadrados no CID F84, além de sessões ilimitadas de psicologia, fonoaudiologia, terapia ocupacional e fisioterapia para TGD/TEA. A própria ANS reforçou esse entendimento em documentos técnicos posteriores, esclarecendo a abrangência da cobertura para abordagens e métodos voltados ao TEA.
Jurisprudência: rol da ANS e reembolso fora da rede
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou que o rol da ANS é, em regra, taxativo, mas admite exceções quando houver recomendação médica fundamentada e inexistência de substituto terapêutico adequado — a chamada taxatividade mitigada. O STJ também reconhece o dever de reembolso integral de despesas fora da rede quando a operadora não assegura atendimento no mesmo município, situação comum quando a rede credenciada não dispõe de prestador apto ao método indicado ou não consegue garantir agenda compatível.
Melhor interesse da criança
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) determina prioridade absoluta à saúde de crianças e adolescentes, garantindo acesso adequado e integral ao cuidado. Em disputas dessa natureza, o melhor interesse da criança orienta a solução: manter o que funciona e evitar trocas bruscas que gerem regressão.
Por que o vínculo terapêutico importa no TEA?
Mudanças de clínica e de profissionais podem interromper ganhos, aumentar crises e prejudicar a adesão. Quando há adaptação comprovada a um método (ex.: integração sensorial/TO; psicologia/ABA; fono de cabine; natação terapêutica), a exigência de troca apenas “para usar a rede” pode esvaziar o próprio tratamento. Ao acolher a clínica indicada pela família, a Justiça prestigiou a continuidade do cuidado.
Quando a “liberação” não resolve
Planos de saúde costumam juntar aos autos extratos de liberações e guias para afirmar que “tudo está autorizado”. Na prática, porém, falta rede efetivamente apta ao método indicado ou não há agenda; outras vezes, a criança não se adapta à troca. Nesse cenário, a solução jurídica adequada tem sido:
• custeio direto no prestador indicado pela equipe assistente; ou
• reembolso integral (100%) fora da rede, enquanto perdurar a indisponibilidade de rede apta.
O que fazer na prática (passo a passo)
1) Peça por escrito a lista de prestadores aptos ao método e com agenda disponível na sua cidade.
2) Protocole as solicitações (presencial, app ou SAC) e guarde os números.
3) Junte prova clínica: relatório médico detalhado, indicação do método (ex.: TO com integração sensorial/método específico; fono em cabine; psicologia), frequência e justificativa da continuidade.
4) Registre as dificuldades de adaptação e eventuais regressões quando tentadas trocas de equipe.
5) Conserve notas/recibos de terapias custeadas pela família para pedir reembolso.
6) Se houver negativa, atue em duas frentes: (i) NIP/ANS; e (ii) medida judicial com tutela de urgência.
Conclusão
O recado da decisão é claro: não basta liberar a guia no papel. Em TEA, garantir o método indicado e o vínculo terapêutico é garantir o próprio tratamento. Quando a rede não entrega a prestação na forma e no tempo clinicamente necessários, cabe custeio fora da rede ou reembolso integral, à luz da RN 539/2022 da ANS, da taxatividade mitigada do STJ e do ECA.
Dr. Rafael Leon Felipe Martins de Souza – OAB/PR 82.898